Formado pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco, com mestrado, doutorado e ainda um curso de direito no currículo, o coronel Fábio Rogério Candido, comandante do CPI-5 de Rio Preto, pertence a um seleto grupo de oficiais que atingiram as exigências necessárias para assumir, por exemplo, o comando geral da PM de São Paulo, posto para o qual foi cotado pelo governo Rodrigo Garcia.

Nesta entrevista ao Diário, ele encara temas espinhosos, não foge de polêmicas como a do armamento ou suicídio entre policiais militares, cobra um choque de gestão que possa modernizar a segurança pública e faz uma defesa aguerrida da categoria. Confira abaixo os principais pontos de uma longa e exclusiva entrevista ao Diário.

ENTREVISTA

Comandante da PM em Rio Preto diz que cidadão armado pode ajudar forças de segurança

Comandante do CPI-5, cotado para posto superior na gestão Rodrigo Garcia, diz ainda que é preciso um choque de gestão para modelo policial mais moderno e um ambiente que não seja opressivo aos policiais

Maria Elena Covre
Publicado em 23/04/2022 às 20:39Atualizado em 24/04/2022 às 07:55
O comandante do CPI-5 de Rio Preto, coronel Fábio Rogério Candido (Arquivo pessoal)

O comandante do CPI-5 de Rio Preto, coronel Fábio Rogério Candido (Arquivo pessoal)

Formado pela Academia de Polícia Militar do Barro Branco, com mestrado, doutorado e ainda um curso de direito no currículo, o coronel Fábio Rogério Candido, comandante do CPI-5 de Rio Preto, pertence a um seleto grupo de oficiais que atingiram as exigências necessárias para assumir, por exemplo, o comando geral da PM de São Paulo, posto para o qual foi cotado pelo governo Rodrigo Garcia. Nesta entrevista ao Diário, ele encara temas espinhosos, não foge de polêmicas como a do armamento ou suicídio entre policiais militares, cobra um choque de gestão que possa modernizar a segurança pública e faz uma defesa aguerrida da categoria. Confira abaixo os principais pontos de uma longa e exclusiva entrevista ao Diário.

Diário da Região – A PM de São Paulo registrou 34 suicídios em 2021, média de um caso a cada 11 dias. O que tem comprometido a saúde mental dos policiais e o que se pode fazer para amenizar o problema?

Coronel Fábio – Trata-se de um problema multifatorial que, no caso dos policiais militares, tem como principais fatores a rotina de trabalho exaustiva; o risco de morte constante; a falta de reconhecimento no que se refere à remuneração; a insuficiência de suporte de serviço de saúde mental; os conflitos institucionais e familiares, como a privação de convívio familiar; o isolamento social; além do fácil acesso a armas. A lista pode não tem fim, mas, em resumo, é o estresse inerente à função policial em todo o mundo, como pude constatar in loco nas pesquisas que fiz nas polícias americanas e europeias. Dar solução a esses fatores depende da vontade governamental. Mas, os comandantes têm que ser facilitadores junto ao seu efetivo, buscando minimizar os riscos. Adotamos aqui no CPI-5, dentro das possibilidades de nossa função, a promoção de um ambiente organizacional que não fosse opressivo.

Coronel Fábio – Na região, o grande desafio é mantermos nossos indicadores criminais que são favoráveis e atuarmos fortemente para não se permitir a prática de criminalidade ultraviolenta que já assolou outras regiões. Para isso, implementamos um sistema em que cada PM de serviço sabe como agir na ocorrência de um evento “ultraviolento”. Isso lhe dá mais segurança no campo de operação. Também temos armamentos, viaturas blindadas e equipamentos para fazer frente a qualquer ocorrência policial. Contamos com todas as modalidades de policiamento, como a Aviação da PM, de um Batalhão de Ações Especiais de Polícia, que inclui o Canil e a Cavalaria.

Trabalhamos cada vez mais com nossas parcerias junto Ministério Público (Gaeco), demais forças de segurança e junto às prefeituras municipais para implantar o que chamo de “Muralha Eletrônica”. Mesmo tendo a clareza de que a criminalidade e a violência são problemas multifatoriais, entendo que a PM pode fazer mais e precisa se tornar alvo principal de investimento do governo, principalmente no maior reconhecimento do ser humano policial militar.

Coronel Fábio – Foram quase 715 mil atendimentos ao telefone de emergência 190, o que demonstra a confiança da população nos serviços prestados pela Polícia Militar. Se a população nos liga é porque confia na qualidade do trabalho da instituição. Dessas ligações, foram geradas quase 267 mil ocorrências no Copom de Rio Preto (96 municípios). Esses tipos de ocorrências (perturbação sossego, averiguações, violência doméstica e desentendimentos) correspondem a quase metade dos atendimentos da Polícia Militar de Rio Preto.

Coronel Fábio – Para resolver muitas das ocorrências aqui apontadas, de forma eficiente, evitando que pequenos conflitos levem a crimes mais graves, adotamos de forma inovadora no CPI-5, a mediação de conflitos e conciliação. Foi tão exitosa tal iniciativa que, em abril de 2019, criamos o Centro Judiciário de Soluções de Conflitos e Cidadania (Cejusc) em parceria com o TJ/SP. Tivemos 90% de resolução dos conflitos, o que vem refletindo de forma muito positiva, sobretudo na questão da prevenção de novos conflitos.

Coronel Fábio – Tal proposta se justifica em razão dos vínculos intermunicipais e da criação da Região Metropolitana de São José do Rio Preto, que passou a englobar municípios da microrregião de Barretos, como Olímpia e Severínia, bem como em pesquisa que demonstra ser Rio Preto a mais buscada pelos moradores desses municípios para atividades de lazer, saúde e educação. Nesta seara, o CPI-3, com sede em Ribeirão Preto, possui oito batalhões operacionais que atendem uma população maior que a da região de Rio Preto, e o CPI-5, o qual comandamos, tem apenas cinco batalhões. Assim, embora atenda a um número maior de municípios, haverá uma divisão populacional e de unidades da PM distribuídas de forma mais equânime e racional.

Coronel Fábio – O governador é o Chefe, em último grau, da Polícia Militar. E eu sou coronel da Polícia Militar, que é uma Polícia de Estado, e não de governo. Por dever de ofício, devemos nos submeter à autoridade do governador e à do comandante-geral atual, por quem temos absoluto apreço. As pautas que defendo, como pesquisador e técnico em ciências policiais, são muito claras e de conhecimento público, dentre elas a necessidade de um choque de gestão para um modelo policial mais moderno e eficiente, que passa também pela maior valorização dos nossos homens e mulheres da corporação, dentre outras tantas medidas que dependem, friso, do governo e não somente da instituição.

O atual comando fez e continuará fazendo o máximo possível, a partir daí é o governo que pode permitir essas mudanças. A sondagem realmente existe, mas a concretização depende de que, na esfera de governo, haja tempo e disposição clara para concretizar as mudanças. Embora haja alguma pressão para que ascendamos a posições mais relevantes no contexto da segurança pública, jamais cederia a ela, a não ser que pudesse realizar tudo que pretendemos, pois nos sentimos preparados para a missão que nos for confiada por Deus.

Coronel Fábio – Vejo como um ato de cidadania um PM ter sua preferência política, assim como o faz nas demais searas da sua vida. O que não podemos é termos a “partidarização” da PM. Cada Policial Militar aprende e sabe que somos uma “Polícia de Estado” e não “Polícia de Governo”; que nossa missão é a de proteger as pessoas, quaisquer que sejam, independentemente de qualquer opção, inclusive, política.

Coronel Fábio – Primeiro, quero frisar que um policial militar da ativa não pode se sindicalizar, realizar greves, filiar-se a um partido, participar de manifestações político-partidárias, usar as redes sociais se identificando com a corporação por meio de símbolos ou designação hierárquica para posicionar-se política ou ideologicamente ou mesmo fazer propaganda política, a não ser a partir do momento que se coloca como candidato.

Assim que a Polícia Militar é polícia de Estado, com valores que devem ser representados como instituição pública, pautando-se pela legalidade e respeito ao cidadão. Atuamos como a PM sempre atuou, independente do momento político, de partidos ou movimentos no poder, sejam de esquerda ou direita. Devemos sempre respeitar o direito de se manifestar, que é constitucional, por outro lado devemos sempre atuar dentro dos limites da legalidade, como polícia de Estado.

Coronel Fábio – É importante frisar que não é o uso de câmeras no uniforme, isoladamente, o responsável pela redução da letalidade ou violência policial. Aqui em Rio Preto não temos câmeras corporais e a letalidade policial baixou devido a outros fatores. A polêmica em torno das câmeras foi construída em cima de premissas equivocadas. As COP (Câmeras Operacionais Portáteis) não foram instituídas para reduzir a letalidade. Tampouco são um projeto deste ou daquele político, mas sim da própria Instituição. Existem há quase 8 anos, trazendo, fortalecimento da prova, segurança e qualidade no ensino pela modalidade estudo de caso. Serve também de elemento dissuasório de atitudes violentas contra o PM,protegendo sua integridade física, na medida em que o infrator sabe que está sendo monitorado. Após a implantação das câmeras, ainda que de forma parcial e incipiente, em 2021 tivemos o menor número de casos de mortes de policiais dos últimos 31 anos no Estado.

Coronel Fábio – Em relação às ações que podem levar à morte do infrator, a sua redução não se dá somente pelo uso de câmeras, mas pela adoção de uma série de medidas pelo comando da PM, desde junho de 2020. Essa diminuição ganha ainda mais destaque por interromper uma sequência de elevações no número de mortes, verificada nos primeiros meses de 2020, também acentuando a queda. A Instituição investe no aperfeiçoamento de seus processos operacionais, por meio do contínuo aprimoramento dos conhecimentos, habilidades e atitudes do efetivo policial-militar que atua na atividade-fim para evitar a exposição desnecessária ao perigo, quando possível, e preservar todas as vidas. Outro foco importante está sendo a depuração interna, que representa um dos aspectos mais fortes na estrutura da Polícia Militar, configurando um sistema de compliance que é referência no serviço público.

Coronel Fábio – O que ele disse foi que “SP fez um pacto com o crime organizado para não combatê-lo”. Parece-me que ele em nenhum momento se dirigiu às polícias. Sobre isso, só podemos responder àquilo que está no nosso campo de ação e conhecimento. Digo com tranquilidade que em relação à PM jamais recebemos ordem para não combater o crime organizado. Não há lugar no Estado de São Paulo onde a PM não entre para combater o crime. Não vejo nada direcionado à Polícia Militar em tais declarações. Aliás, jamais podemos deixar de lembrar dos nossos heróis que tombaram em maio de 2006, quando 23 PMs foram mortos e mais de 20 também foram feridos. Por Deus, se alguém fez acordo, e certamente isso não envolve a Polícia Militar, quem sabe um dia pague essa conta!

Coronel Fábio – Sou um defensor do armamento. Um cidadão armado, além de suprir a necessidade de defesa pessoal, torna-se um potencial “ajudante” das forças de segurança da sua região. Vi e vivi isso nos Estados Unidos, quando de minhas viagens de estudos para lá. Se muitos possuem uma arma, o criminoso pensa duas vezes antes de atacar alguém, pois suas chances de sair ileso diminuem. É a chamada “teoria econômica do crime”, ou seja, o crime aumenta ou diminui conforme seu custo/benefício.

Também acredito ser um direito natural do cidadão ter uma arma a fim de defender a si mesmo, sua propriedade ou sua família, enfim, ao negar a posse de arma, o Estado está negando um direito do cidadão. Por outro lado, penso, logicamente, que deve haver as exigências legais para posse e porte de armas de fogo, as quais devem ser cumpridas.

Coronel Fábio – Avalio que pouco avançamos, mas que evitamos maiores prejuízos para a categoria. Temos boa representatividade na Câmara Federal com os deputados eleitos com base na PM, os quais espero que se reelejam. Mas penso também que falta alguém para compor (em objetivos) e contrapor (em postura) nossos deputados estaduais, que tem buscado nos representar. Entendo que a Assembleia Legislativa seja o grande cenário nas próximas eleições para fortalecermos a Segurança Pública e trazermos as pautas importantes para o debate junto ao governo estadual, que, em verdade, são os grandes responsáveis pelas políticas públicas nesta seara, por força até constitucional.

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